Causos da época da pindaíba, o prato feito de 'dois real'



Hoje é daqueles dias que o tico e teco não querem trabalhar. Tenho de fazer um esforço extra para os neurônios se mexerem. Deve ser pela correria do dia  a dia, ou pelo cansaço acumulado, afinal hoje é sexta-feira, ou apenas o sangue trabalhando para ajudar na digestão do almoção feita a toque de caixa no centrão de Campo Grande a nove reais. Legal, é o aviso pregado na parede ao lado dos pratos: “A repetição é permitida uma vez desde que não haja desperdício”. A comida? Ah, a comida vale os nove reais. E, pensar que já foi pior...
Início dos anos 2000, então jornalista na Folha do Povo, lá na rua 26 de agosto, em frente ao Mercadão Municipal. Solteirão, ajuntando uma grana suada para seilá, comprar um carro, uma poupança, uma viagem, ou para qualquer outra coisa mais importante.
Uma das nossas “diversões” era buscar um PF bom e barato. Está bem, mais barato do que bom. Certa vez, na companhia de um parceiro de redação, avistamos uma placa: “Prato feito a dois reais”. Opa, vamos lá ver o que é. Se tiver uma carninha, arroz e feijão está bom demais. O local em questão ficava ao lado de onde hoje é o Camelódromo. Parecia uma conveniência, mas haviam improvisado umas quatro mesas, umas cadeiras, para o almoço.
Chegamos, sentamos, e apareceu o “garçom”. Um caboclo forte, de macacão, cara mais de mecânico ou estivador, nos atendeu e pedimos o pratão de dois “real”. Até aí, tudo bem, até que o funcionário perguntou se a gente não queria o suco de laranja que vinha de brinde. Opa, sem pestanejar, aceitei. Meu amigo, mais cauteloso resolveu esperar. “Quer o suco com gelo? Opa, por favor”. Para quê?! Me lembro como era hoje. O rústico funcionário começou a bater um saco de gelo no chão. Melhor (ou pior), no meio do pequeno salão. Uma visão quiçá grotesca, e já comecei a arrepender. Em seguida, com o copo já de suco, sujeito vai e mete a mão e leva os cubos despedaçados ao vasilhame de nome copo. “Por favor, me vê uma Coca!”, rápido o meu amigo. Eu? Consegui traçar o Jesus me chama. Mas o suco, nem que estivesse eu um bagaço. Tempos de pindaíba. Causo daqueles que a gente gosta de lembrar e, hoje, dar risada. Mas, que, ainda bem, a gente passa...longe. Pensando bem, nove reais é luxo.

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