Sou a favor do Neymar, vai. Mas este texto é muito bom

Antes, achava que o Neymar tinha de ficar no Brasil. Depois, nessa metamorfose ambulante que somos mudei de ideia e espero que ele arrebente na Europa.
Mas, compartilho com vocês este belíssimo texto do Antero Greco, do Estado de S. Paulo, publicado na quarta-feira (22).
Mais um para minha série, texto que gostaria de ter escrito. Mas, seilá, ainda tenho que comer muito espetinho com mandioca, ou sobá...


O brasileiro quer tristeza, por Antero Greco

Houve época em que o brasileiro se identificava tanto com alegria que esse sentimento se estendia para o futebol. Dentro e fora de campo, na mesma proporção, contavam o prazer e a emoção que vinham dos dribles, da malícia e dos gols. Os tempos mudaram, parece que ficamos menos expansivos, e os reflexos aí estão: nosso jogo de bola virou uma coisa chata e monótona, as arquibancadas foram tomadas por gente violenta.
Nós nos deixamos dominar por tristeza, além de incontornável sentimento de inferioridade no esporte em que somos (ainda) os únicos pentacampeões mundiais. Tanto que só conseguimos exaltar o que rola na Europa. E, pior do que isso, torcemos, fazemos força para que batam asas os poucos astros, os raros jogadores que servem de referência para atrair público.

Tenho acompanhado com atenção, e aflição, o noticiário em torno da iminente transferência de Neymar. A cada novo detalhe impecável que leio no Estado sobre os encontros entre dirigentes, empresários, agentes, marqueteiros e a tropa de choque do Barcelona, confesso que me dá um aperto danado. Pego o jornal na esperança de ler que tudo virou fumaça, que os espanhóis recolheram a papelada, fizeram as malas e foram cantar em outra freguesia. E, no entanto, me frustro com mais e mais pormenores, que levam a crer que o acordo se torne irreversível.

A satisfação do pessoal que vai lucrar com a transação não me surpreende. Eles enxergam cifrões e não uma bola. O desalento pega mesmo quando vejo que até o Santos – ou, agora, principalmente o Santos – está louquinho para se desfazer do rapaz. Não porque se decepcionou com ele. Longe disso. Mas porque precisa de dinheiro, o bendito combustível que move a vida.
Um ano e meio atrás, quando Luís Álvaro de Oliveira anunciou que Neymar não sairia antes de 2014, e olhe lá!, vislumbrei o início da grande revolução no futebol nacional. Ali estavam um cartola e um clube dispostos a remar contra a maré, a dar as costas para os euros e a apontar o caminho para os demais. Com ações de marketing bem-sucedidas, seria enfim possível segurar as pérolas por diversas temporadas e não entregá-las aos gringos na primeira oferta. Ilusão. O Santos também capitulou, ou está bem próximo de ceder.

Como desencanto pouco é bobagem, corro atrás de reações de fãs, crítica, boleirada e respectivos professores, pra constatar o óbvio: regozijo amplo, geral embora não irrestrito, pois a melhor novidade que pintou por aqui na década está com pé e meio fora do País. Com apenas 21 anos! Idade em que começaria a deslanchar, a crescer, a dar retorno maior, será repassado para os tubarões da bola, cuja voracidade não se satisfaz jamais, que vai em busca de presas onde quer que surjam, e não desistem enquanto não as capturarem.
Os bem-intencionados alegam que Neymar poderá crescer, evoluir, concorrer com os maiorais de sua categoria para um dia vir a ser o melhor do mundo. Alegam também que não lhe acrescentam nada torneios pobres como os que há por estas bandas. Ou ainda se argumenta que é importante o aprimoramento, já que em 2014 teremos o Mundial e ele é imprescindível para o sucesso da seleção. Como se pudesse vir a ser o salvador de um time sem carisma.

Nossa autoestima anda em baixa mesmo. Craque é pra segurar de todo jeito, para usufruir o máximo, para dar inveja aos outros. Astro tem de ser chamariz para publicidade, mídia e plateias, além de ponto de partida para formação de grandes times. Estrela divulga o clube, faz com que seja conhecido, admirado, respeitado. Bons jogadores são fundamentais para campeonatos de valor.
E o que fazemos? Empurramos, quase enxotamos Neymar – o “monstro”, o “cai-cai” -, para daqui a algum tempo babarmos com ele a correr por campos estrangeiros. Vamos aplaudir pela telinha da tevê, repetiremos à exaustão a cantilena de que o futebol aqui não tem jeito e não mudaremos nada, nunca!
O brasileiro curte tristeza na bola.

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