A morte do torcedor na Bolívia é daquelas coisas que vira conversa para pais não dormirem


Quando você vira pai, você fica medroso. Esta frase foi dita há mais ou menos um ano, por um amigo em conversa tempos depois do nascimento do rebento. E, acho que nem ele teve ideia de quanto isto ficou na minha cabeça. E, gera muitas interpretações.
Uma delas é a de que quando você é apenas um garoto, um jovem, um rebelde sem ou com causa, tem aquela impressão de ser um “H. Aço”. Nada é impossível. Só depois de muito tempo comecei a entender, como será meu futuro, como será o seu? Se meu filho nem nasceu, eu ainda sou o filho. Mas, você vira pai e se intensifica os dias de luta, independente da ira que tens. Começa a pensar uma, duas, três, mil vezes, sabe como é né, tenho família para cuidar. Dependo deles e eles dependem de mim.
A outra verdade desta frase é, justamente, a mania, muitas vezes sem querer querendo, de proteger a prole. Cuidado com tal coisa menino, vai ter muita gente, a multidão é um monstro. E, se tiver confusão? Medo de que algo ruim aconteça. Dá uma angústia só de pensar.
A lembrança da frase e a consequente conversa para pai não dormir está muito forte na minha cabeça. Se você estiver lendo esta coluna (desde já, muito obrigado), saiba que, excepcionalmente, estou escrevendo no começo da tarde da última quinta-feira. E, se você gosta de futebol, ou mesmo que nem seja muito fã, no mínimo imagina o porquê da infeliz
motivação de estar digitando o texto com antecedência. Não daria para esperar até o dia de ontem, como geralmente acontece.
A morte do torcedor de 14 anos provocado por um sinalizador durante o jogo entre Corinthians e San José, na Bolívia, é daquelas coisas que me faz duvidar de qual é o papel do esporte em nossas vidas. Tenho um filho de oito anos e, um fato deste me faz perder muitos pontos na carteira de torcedor que tenta mostrar o quão gostoso é torcer, vibrar, ficar feliz.
Quando ouvi a notícia, ainda durante a transmissão da partida, sinceramente, não quis escutar. Pensei, vai que entendi errado, ou foi um mal-entendido. Mas, de manhã, à medida que a notícia invadia todos os meios de informação possíveis, um turbilhão de sentimentos detonava o cérebro e o sentimento. Era tristeza,  melancolia, raiva, indignação, e o pior: como deve estar a família do boliviano Kevin Douglas Beltran Espada.
Longe de qualquer discussão clubístico, bairrista, ou provinciana, alguma coisa tem de ser feita. O futebol não é nem um exemplo de campo onde a lucidez impera. Mas, chega de empurrar os problemas com a barriga. “Ah, só porque é o Corinthians, é perseguição!”. Às vezes é melhor ser surdo. A torcida fez um bonito papel no Japão, durante o Mundial, e não se ouviu reclamações contra a cobertura. Por outro lado, teve alvinegros indignados que defenderam a exclusão da equipe da Libertadores. Desgraçadamente, duvido que punições drásticas acontecerão. Consolado ficarei se estiver errado. “Trocaria o Mundial pela vida do menino”. “A partida perdeu o sentido. Vamos ficar pensando nesta fatalidade. A volta para o Brasil vai ser dura. Dificilmente, conseguiremos dormir”. Opiniões de efeito do técnico Tite e do gerente de futebol do Corinthians, Edu Gaspar. Que surtirão efeito mesmo, se a dupla acima mencionada empenhar-se de fato, em encarar o problema da violência. Que o atual campeão do mundo de clubes, tantas vezes citado como exemplo para o futebol brasileiro, seja pioneiro também neste intrincado campo. Na paz.
Ciente, ou seria otimista?, de que dias melhores virão, volto a esta coluna daqui a 30 dias.

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