Apocalipse nos Trópicos é um Recente Testamento - e bem vivo - do Brasil
E aí?! E o Apocalipse nos Trópicos? Petra Costa manda outro desconfortável porém necessário documentário que tem a ver com o Brasil-il-il de hoje. Cinco anos depois do bem bom Democracia em Vertigem 2019 – pego como base o lançamento mundial – essa mineira de 42 anos externa país afora parte de uma nação que é difícil de botar fé.
Óbvio, a essa hora você deve ter lido, ouvido e visto coisas sobre o longa de quase duas horas. Se não, vai aí o momento (trecho de) sinopse:
“Quando uma democracia termina e uma teocracia começa? Em APOCALIPSE NOS TRÓPICOS, Petra Costa investiga o crescente controle exercido por líderes religiosos sobre a política brasileira. A diretora obtém acesso aos principais líderes políticos do país, incluindo o Presidente Lula e o ex-presidente Bolsonaro, bem como um dos pastores mais famosos do Brasil - uma figura proeminente que parece manipular certos políticos como fantoches.”
Esse tal pastor conhecido é, o “ator principal” desse manancial de cenas, passagens, e outras coisas mais, do filme. Sinceridade, nunca vi nenhuma pregação televisiva, whatsapp/telegram ou bagulho semelhante vinda desse ser. Infelizmente é tipo Big Brother ou “bastidores” de (pseudo) celebridades, saca? Uma hora aparece alguém para falar sobre.
Petra Costa talvez o tenha me apresentado da maneira mais sem filtro possível. Líder que mistura pragmatismo, discurso com alta carga emocional,meio que um “coach religioso”, e agressivo. Bem agressivo. “Não vamos refrescar”, “aqui a gente arrebenta eles”, e por aí vai. Nada que surpreenda seus milhares de seguidores. Desejaria que sim, mas, não.
Pra encerrar o espaço pastor, e de como é perigoso generalizar, o Paulo Marcelo faz uma pontinha. Assim, a obra deixa pequeno recado que entre os evangélicos nem todos e todas chegam à situação de em plena calçada orar de frente para a parede.
O resgate de um tempo nem tão distante traz mais de uma sensação. A falsidade nas encenações religiosas em pleno Congresso Federal, aquela gente com ódio nas ruas – realmente passava longe a Bíblia ser instrumento de vossa paz – é de dar medo.
Ao mesmo tempo, em modo “seria engraçado se não fosse trágico”, as manifestações em frente aos omissos quartéis, as palavras de ordem sem sentido, e as coregrafias, dentre outras bizarrices. Trote de calouro perde por muito, viu?!
Foi mal, não vou para o céu mesmo (aliás, parafraseando PJ Harvey, espero poder ir para qualquer lugar), tive algumas incontinências de riso. Pensava, será que eles não tem noção do ridículo?
Sigamos, e outro ponto nevrálgico abordado por Petra é Brasília. A direção recorda a ideia inicial dos criadores da capital federal. Não era bem para esse tipo de cruz que ela foi utopicamente imaginada.
A imagem dos tanques a desfilar em meio a um território que nada tem a ver com eles é desanimadora. Menos para o numeroso bando de louvor ao senhor. Deve ser ao senhor das guerras que não gosta de criança, já lembrava a ilustre banda formada lá no DF, acho que se chamava Legião Urbana.
Apocalipse é dividida em capítulos, talvez uma alusão ao livro sagrado dos cristãos. Revisita a eleição pré-Bolsonaro, e, com memória de elefante e riqueza de uma diversa fauna política, passa pelos percalços e histerias pré-eleição de Lula, até o desfecho na tentativa de golpe do 8 de janeiro de 2023.
As quase duas horas seguem sem perder o fio da meada que é a influência da religião. Mais notadamente sob a sombra do pastor que levanta a voz e reafirma: a democracia é para a maioria! As minorias (indígenas, LGBTQIA+), que se danem.
A parte em que “Messias” discursa com obediente olhar ao pastor, tal qual um ventríloquo é uma bela sacada do documentário. Não tinha percebido, sério mesmo.
A produção vai fundo no cerne dos pastores populistas e suas origens made in usa. Pelo menos desde a década de 60, o lado religioso metia o bedelho. No Brasil, o filme cita de passagem do esforço da Igreja Católica em silenciar a corrente da Teologia da Libertação. O que – pensamento meu – acaba por ajudar a acelerar de uma forma geométrica a força dos evangélicos no país.
O documentário tem um capricho na montagem, na edição, fotografia – com participação na equipe do baita fotógrafo Ricardo Stuckert – e música a cargo de Rodrigo Leão. E canções alto nível, como Hermeto Pascoal, Odetta Gordon, e Nelson Cavaquinho. Juízo Final destrói.
Como curiosidades, uma já sabida e surpreendente, a de que um dos produtores executivos é Brad Pitt. Ele mesmo.
A outra, aleatória de minha parte, a Flora Thomson-DeVeaux ajuda nos lances traduções inglês-português. Eu a escuto no podcast Rádio Novelo e admiro seu trabalho e humor.
Eita, falei demais. Se conseguiu chegar até aqui, valeu.
Sei que não vai, mas, se quiser entre em contato.
Pode ser para trocar ideias, e se puder me apoiar de alguma forma, de boa.
Em caso PIX, a chave é o e-mail mesmo: blogdokisho2@gmail.com
Brigadão
Adendo: nessa toada sugiro mais duas coisas.
A primeira é a série do canal do Bob Fernandes no YouTube sobre como o neoliberalismo foi “organicamente” planejado nos Estados Unidos para entrar no Brasil (adicionar mais coisas e linkar). Assim como aparece em Apocalipse dos Trópicos, é preciso encarar a guerra agora no campo das ideias.
A segunda é bem mais antiga. A Mariana Sampaio - @madamefrigida no twitter - traduziu a baita entrevista, em todos os sentidos, do Glauber Rocha ao Cahier Du Cinema, em 1969. Pelo Google Drive, acesse https://t.co/gF3vzcNo4a
Em ambas ainda estou em andamento, mas adianto que tá muuuito bom.
Abraço.
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