Wim Wenders e “aprenden-ders”, a dica é Dias Perfeitos


 Desejaria estar em ânimo melhor. Dias Perfeitos (Perfect Days) pede isso. Ou, tem esse efeito. Sem estripulias. Sem pirotecnia. Muito menos o trocadilho sem noção no título deste famigerado texto. Foi mal, escapou.

O longa-metragem lançado este ano no Brasil é a cara do seu diretor. O alemão Wim Wenders é daqueles cineastas que divide opiniões.
Eu gosto muito do tiozinho que completou 79 anos no último dia 14. Tem Paris Texas. Asas do Desejo, Buena Vista Social Club, e muitas outros filmes porretas e premiados. Porém, o que mais lembro é bem menos badalado Até o Fim do Mundo, de 1991.
Dias Perfeitos se passa em Tóquio, onde Hirayama leva uma vida sem luxo. É encarregado de limpar banheiros públicos, tem um carro com som de fita cassete. Atenção para a trilha sonora, majoritamente de nomes conhecidos dos EUA. A “jukebox” ou “playlist” do Hirayama-san é muito boa, em minha opinião. Velvet Underground, Patti Smith, Lou Reed, Otis Redding, Nina Simone, e mais coisa. Fina.
Em cada trecho de seu caminho cotidiano, uma música de suas preciosas fitinhas magnéticas. Nostalgia pura, sobretudo quem pegou essa época. Duplo deck, auto-reverse, ih, o aparelho comeu a fita. Vocabulário que entrega idade.
O nosso personagem tem interpretação destruidora de Koji Yakusho. Seu desempenho rendeu a premiação de Melhor Ator em Cannes. 
De modo quase minimalista, Hirayama adora sua rotina. Desde quando acorda com o varrer da rua na vizinhança, passa pela hora do almoço em que vai a um parque e aproveita para todo dia tirar fotos com sua máquina analógica (quem é da época do filme 135 milímetros?), e fecha a noite em um bar, quando pede sempre a mesma bebida. Antes de dormir, uma leitura – outro de seus hobbies – e, pronto. Tudo certo em seu lar, que não tem televisão.
Esse ar de bucolismo, digamos assim, tem visível assinatura de Wenders. Sem pressa, mas às vezes com aquelas sobreposições de imagens presentes em outros de seus trabalhos. Muitas referências de seus gostos, uma direção que parece nem estar ali. Está. E, vai bem.
Mais uma vez para marcar: o trabalho dele é assim. Quem não gosta, dificilmente vai mudar de ideia. Quem não conhece, esse longa é uma boa, hein?!
Se parar para pensar essa paz que permeia o filme é em uma cidade que consegue ser maior e mais movimentada que São Paulo, por exemplo. O desafio de Wenders em nos convencer que a megalópole pode ser calma é gigante.
Volto ao Dias Perfeitos. Hirayama tem seus fantasmas. Uma hora iria aparecer alguns. Sempre aparece. E, belo dia, chega a sobrinha, interpretada por Arisa Nakano, que fugiu de casa. Acampa em seu cafofo. A relação dos dois é tipo choque de modernidade com espécie de um Dersu Uzala urbano. “Quem é Spotify?”, rebate ele a pergunta da garota que curtiu o gosto musical do tio.
Desacostumado a ter companhia, o tio aos poucos gosta da ideia. A sobrinha, que no começo achava o jeito de Hirayama um tanto exótico, entende o estilo de vida dele. “Da próxima vez é da próxima vez. Agora é Agora”.
E que limpar banheiros não torna ninguém pior ou melhor que outra pessoa. Sua mãe é bem sucedida. A cena em que ela surge para buscar a filha é recheada de simbolismos. Tanto familiar como de classes. A mama, vivida por Sayuri Ishikawa, nunca tinha visitado o seu irmão. Ela chega com motorista particular. Entendeu, né?!
O fio da história reserva mais percalços ao “pacato cidadão” Hirayama. Evitarei dar mais spoilers. Vai que você não assistiu.
O que rola falar é: Dias Perfeitos não tem tiro, violência física, nada gratuito, apenas para “causar”. O filme tem duas horas, assim, fique ciente da sutileza, da importância dada às pequenas coisas do dia a dia, de como o protagonista encara a sua situação. Wim Wenders acerta a mão em tornar o ambiente leve sem parecer de uma alegria utópica, falsa. 
Koji Yakusho ajuda muito nesse sentido. Impossível não simpatizar com seu personagem. Faz você se sentir bem. Feeling Good, como esplendidamente canta Nina Simone.
Deu. Melhor assistir. Se já viu, beleza.

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