Só vi agora, é animação, tem Selton Mello e Camila Pitanga. Então, vale a dica

 



Da série Atrasado, estou bastante. Uma História de Amor e Fúria, de 2013, é uma boa produção em animação brasileira. Nem lembro como cheguei nela. Tropecei nela por meio da Netflix, e prestei atenção na figurinha quando apareceu: “com Selton Mello, Camila Pitanga e Rodrigo Santoro”. Este último, na real, é mais uma pegadinha. Ele faz aparição especial. Porém, ao menos seu personagem fala, se é que você me entende.
O longa animado tem direção do paulistano Luiz Bolognesi, que entre outras coisas foi produtor em O Bicho de Sete Cabeças (2001), este sim com baita presença de Santoro, no ótimo filme dirigido por Laís Bodanzky. Como quem tem boas amizades tem tudo, ela é uma das produtoras da animação de pouco mais de 70 minutos. 
Imagens: Reprodução

 
A história tem como mote central o amor entre um homem (Selton Mello) e Janaína (Camila Pitanga). Começa em 1566. com o casal na pele de indígenas da tribo dos Tupinambás, e percorre períodos históricos do Brasil até chegar ao distópico Rio de Janeiro de 2096.
O fato de Uma História de Amor e Fúria ter sido lançado há onze anos passa longe de levar o carimbo de coisa datada. Nascimento e renascimento do Guerreiro e seu amor eterno por Janaína é o fio condutor de uma espécie de Forrest Gump brasileiro. Nada glamouroso, porém cru, raiz, verdadeiro. Embora, bom lembrar, trata-se de uma ficção. Com muito fundo de verdade.
O longa divide-se em fases. Começa com a chegada dos europeus no começo da colonização. O tupinambá Abeguar, depois de escapar da morte de um jeito avoado, recebe a missão do pajé: Anhangá (espírito da morte e destruição) vai dominar geral, e ele vai ter de aprender a enfrentar a bagaça, além de não poder morrer até que sua missão esteja completada.

A trajetória secular do guerreiro passa pelo Maranhão, onde é Balaio. Cara que sofre com a pobreza e se indigna com a violência praticada pelos homens da lei e com os altos impostos cobrados pelo governo. Era lá por 1800 e, cansado de tanto sofrimento, junta a população pobre de Caxias e. promove a Balaiada. Obs: quem é fã do Duque de Caxias vai sentir certo incômodo nessa parte, beleza?!
A parte visual da animação é bem boa. Nada a perder diante das produções gringas. ainda mais que é de 2013. Aliás, coincidência, é o mesmo ano que foi lançado O Menino e o Mundo, de Alê Abreu. Ow, se não assistiu ainda, depois dá uma procurada. Superou Uma História na disputa nacional e concorreu ao Oscar 2016 da categoria por sorte.

Uma História salta para o fim dos anos 1960, em que revisita a ditadura. São Paulo, capital. O protagonista é um jovem que entra para a subversão muito por conta de Janaína boa de mira. Nesta fase, Selton Mello sendo Selton Mello, narra um “cheguei atrasado”. Seu amor tem namorado, o Júnior, interpretado por Santoro. Que, aparece também no início como o cacique Piatã, desafeto do ser que perpassa o tempo.
Destaque para as imagens, colagens, trazem ar documental para a obra. Torturas, clandestinidade, caguetas. Memórias, muito necessárias, memórias.
A trilha sonora que acompanha o enredo tem tudo a ver, gostei bastante: é assinada por Rica Amabis,
Tejo Damasceno, e Pupillo. Opa, pessoal do Nação Zumbi volte e meia aparece em trampos audiovisuais. A faixa No Olimpo está no longa, que ainda tem outras canções bacanas como Morada Boa (3 Na Massa), O Silêncio das Estrelas (Lenine/Duda Falcão), e Flutune (Flu/4 Nazzo/Marcelo Fruet), entre outras.
Se lá na Balaiada, a licença é para introduzir o Cangaço, os desdobramentos do casal e seus coadjuvantes durante os anos nada dourados recaem no surgimento das facções que ganhariam a cena nos morros do Rio de Janeiro.

A Cidade Maravilhosa em versão Rio Babilônia futurista fecha o longa. Em 2096, o local é protegido por, adivinhe, milicias. Totalmente legalizadas, fazem o papel de polícia. Daquele jeito.
Cau, que foi Manuel Balaio, que foi Abeguar, agora é JC. Jornalista exausto de dar murro em ponto de faca, de denunciar as coisas e nada acontecer, e que passa os dias bebendo e pagando para transar com...Janaina. Que tem uma vida dupla: trabalha em uma boate e, ao mesmo tempo, se mantém firme em favor de mudar o sistema. No caso, brigar contra uma empresa que controla a água potável do aquífero Guarani. Ah, acho que tu sabes, se não, esse aquífero também passa por baixo – e muito - de Mato Grosso do Sul. Sério, pesquisa aí.
Essas sacadas históricas e de geopolítica da produção de Bolognesi, Bodanzky, e companhia, são bem legais. Pelo que vi rapidinho na internet, o filme foi até pauta em preparação para vestibulares e tal.
É isso, se não assistiu, fica a dica. E, uns dizeres de Uma História de Amor e Fúria:
"O passado é o que tá acontecendo agora
A cada dia que passa uma nova página é escrita
com histórias cheias de amor e fúria
Viver sem conhecer o passado é viver no escuro."

O legal também é que dá para ver até no YouTube. Deixo aí um dos links que tem a filme na íntegra.

- E vale também dar uma olhada na Wikipédia do filme (contém spoilers). Tá bem completinha

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