Drive My Car é daqueles filmes que te implode aos poucos


E aí, tudo bem?

Drive My Car (Doraibu mai kā). É de 2021, chegou ao Brasil no ano seguinte, e, assisti esses dias. A produção japonesa de quase três horas tem na direção Ryüsuke Hamaguchi e levou o Oscar de Filme Estrangeiro 2022. 
Concorreu também a Melhor Filme (No Ritmo do Coração foi o vencedor), Direção (Jane Campion ganhou com Ataque dos Cães), Roteiro Adaptado (No Ritmo do Coração, de novo), além de melhor roteiro em Cannes 2021. Pois é, só vi agora…
Outra coisa que me guiou ao longa foi se basear em conto homônimo de Haruki Murakami. Sei, vai cativar zero pessoa, mas quem quiser presentear com alguma obra dele, fique à vontade.
Bora lá, momento sinopse: “Um renomado ator e diretor de teatro forma um vínculo improvável com sua motorista particular, forçando-o a enfrentar os mistérios perturbadores de sua falecida esposa.”
Já aviso, tá complicado falar do filme sem rolar spoilers.
No longa, o ator principal, e também diretor, Yusuke Kafuku, tem maneiras peculiares em seu processo criativo. Enquanto dirige, manda o play em um toca fita com diálogos da peça. A fitinha K7 até parece, sei lá, uma Alexia, Siri, da vida. Ou, até coisa de Inteligência Artificial.
O jeitão retrô diz muito da personalidade do protagonista interpretado por Hidetoshi Nishijima, hoje com 53 anos. O estilo meio introspectivo, meio das antigas, reflete em seu carro, um modelo visivelmente a léguas dessas naves modernas de hoje. Curiosamente, em um país conhecido por sua modernidade e que se orgulha da tradição automobilística.
Na outra ponta do seu processo de absorver experiências para seu trabalho está a Oto (Reika Kirishima, 51), sua mulher, que tem altas ideias de roteiros, histórias, durante o sexo. Ainda mais nas cenas iniciais do longa-metragem, o casal parece se dar bem mesmo.
Até que, o ator/diretor teatral vai ao aeroporto, de onde partiria como convidado de evento na área. Só que, devido ao mau tempo, o avião não decola, seu voo é adiado, decide voltar para casa, e quando entra em seu lar vê a mulher com outra pessoa.
Daí pra frente, Drive My Car foge de uma história “normal” estilo dramão e lugares comuns.
Pode ser só impressão, esse trabalho é de 2021, mas parece vir em uma crescente filmes com menos pirotecnias e mais ênfase em interpretações e visível mão da direção.
Ou eu que estou em uma levada dessa, sei lá. Anatomia de uma Queda, Ficção Americana, A Baleia, Meu Pai (The Father), documentário Memória Infinita, entre outros títulos, vão meio nessa vibe. Eu acho...
Diálogos e atuações do casal são cercadas por poucas palavras e muitas feições que gritam sem a necessidade de soltar o verbo.
Um salto na cronologia do longa, vai que você não assistiu, e Kafuku foi parar em Hiroshima. Até chegar por lá, vale a pena contemplar as curvas que não são da estrada de Santos e, sim, parte da paisagem do litoral e da urbanidade japonesas.
Na cidade que foi um dos alvos de bombas atômicas na Segunda Guerra entra em cena Misaki Watari (Tôko Miura, 27). Ela é a motora encarregada de dirigir o carro de Kafuku, que aceita contrariado, mas não tinha outro jeito.
O motivo da estada dele é selecionar elenco para peça de sua autoria e já bem conhecida. A escolha de atrizes e atores é bem interessante. Quem se candidata também.


Nesse processo, a frieza e a desconfiança entre o diretor e a motorista desaparecem aos poucos. A personagem de Toko Miura leva consigo tom melancólico, de quem ás vezes parece estar pensando longe. Ou, tanto faz.
Já ele segue meio perdido, ou sem entender muito bem o que passou em sua vida.
Vai ter um cara para acelerar esse processo. Takatsuki (Masaki Okada, 34), jovem ator (ao menos em comparação a Kafuku), se inscreve para a seleção. Os dois já se conheciam de outros bon-odoris, e o “intruso” nutre admiração acima da média por Kafuku e Oto.
Dizer que a trama se desenvolve com foco nos problemas existenciais dos personagens é resumir muito a bagaça.
Embora a maioria das coisas por ou sem querer gire em torno dela, Oto é quase participação literalmente especial.
A história tenta se encaixar principalmente entre a balizas demarcadas pela motorista, o diretor da peça, e seu soturno aficionado. A interpretação do trio é muito louvável.
As locações, a fotografia é um misto daquilo que usualmente se pensa do país do sol nascente, aliada a fotografia que remete a quadros, mesmo que por um segundo, principalmente nas andanças de Miura e Kafuku.
Sentimento de perda, mágoas, coisas mal resolvidas, culpa, abuso… dá para pincelar várias situações trazidas pelo combo Murakami, Hamaguchi na direção, e também Tamakasa Oe, responsável pelo premiado roteiro, ao lado do diretor.
É isso. Drive My Car é pedida para assistir sem pressa. Se já passou por lá, conta aí.
Imagens: Divulgação

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