O papo de 3 Antônios e 1 Jobim faz 30 anos e segue boa de escutar

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“O Brasil sofreu muito a influência benéfica da imigração estrangeira. Os italianos, os sírio-libaneses, os alemães, os espanhóis, fizeram o Brasil contemporâneo. Mas, aí deu-se um fato, e esse é o fato grave. É que a oligarquia brasileira é tão poderosa que ela coopta todas as classes dominantes sucessivas.


Chega um camarada da Itália, por exemplo, ele vem pro Brasil, colono de café. Sobe, compra o sítio, fica fazendeiro, fica rico, ele passa a tratar os empregados dele exatamente como ele foi tratado, como escravo.

As classes dominantes brasileiras estão, não as mesmas famílias, mas a mesma classe está no poder há quatrocentos e tantos anos.


A revolução soviética acabou com o feudalismo na Rússia, como a Revolução Francesa acabou com o feudalismo na França. E nós não acabamos ainda com o feudalismo.” - Antônio Houaiss

Opa, beleza?!

Esse trechão aí em cima ficou matutando em minha cabeça desde que assisti o documentário pela primeira vez. Este ano. Tinha gravado do Canal Brasil, se não me engano.

Responsável pela groselha da vez, 3 Antônios e 1 Jobim, de Bebeto Abrantes e Rodolfo Brandão, é baita dica. Mesmo lançado em 1993, ou seja, 30 anos – sério, desconhecia que cairia em um ano redondo para falar dele – é um deleite ver quatro personalidades gigantes conversarem numa boa, na medida do possível, já que é em frente de câmeras e tal.


A produção juntou para trocar ideias Antônio Callado, Antonio Candido e Antônio Houaiss – cara, desistir de escrever o que os caras são, eles foram e ou são muita coisa, se você tem vaga ideia, pesquise à vontade – e Tom Jobim. Este, imagino que você, assim como este que escreve, conheça pelo menos de (literalmente) ouvir.


Entre massas e bebidas, de quebra ainda tem como fio condutor outra baita pessoa, Zuenir Ventura, o quarteto versa sobre uma pá de coisas.


Em pouco mais de uma hora, os Antonios + o Jobim, abordam muita coisa. Importante lembrar: a produção é de 1993. Ter noção do contexto histórico é necessário. né. Menos de dez anos da Diretas Já, e, pouco distante dos anos 2000.


Aparecem imagens em preto e branco, nostálgicas, de um Rio de Janeiro com direito a imagens de aviões da Varig e da Vasp, transparece menos bruto do que os dias atuais.


Olha, é até difícil escrever sobre quem domina como poucos a língua portuguesa. Tenho nível para isso, não.

“Algibeira, álgebra, alface, alfafa... Aí o cara não aguentava mais. E tome chopp, tome chopp. E, ele, com licença, eu vou “al banheiro”, brinca Tom Jobim. O artista meio que assume o papel de dar uma quebrada no documentário, por vezes bastante sério. Calma, a produção cuidadosamente passa longe de ser sisuda.


“Há vinte anos atrás, se me perguntassem o que valia mais. Se o autor, se a ideia, eu responderia sem hesitar, que o autor. Agora já não sei mais. Vivo incerto. O homem é coisa sublime, porém, se as ideias prevalecessem sobre os homens, já de muito que a paz teria pousado sobre essa terra”, profere um dos convidados. Viu?! Que que vou acrescentar? Só escutar, aprender, e curtir. Como um leigo intrometido.


Encontro começa na cozinha, receita de espaguete.


“Quanto Antônio junto!”

A origem de Antônio ninguém sabe, diz Houaiss;(Mas) Eu vi isso em sua enciclopédia – brinca Jobim, que faz às vezes de piadista da turma. Sem deixar de emitir contundentes opiniões, fato inerente aos quatro personagens em questão


Outras passagens pinceladas:

“Essa coisa me sempre fez a imagem do operário. Operário intelectual, operário das letras, operário da palavra porque de todos esses setores o que mais amo é a palavra”, Houaiss

“Como é que o homem pode viver sem utopias? A gente não sabe”, aliás, ideias irrealizáveis vai voltar ao diálogo mais para frente.


O golpe de 64 também é lembrado. “Tive o privilégio de ser cassado na primeira lista, ou na segunda lista dos cassados”, ironiza um deles.


Na segunda metade da reunião, o quarteto de craques desanda a lembrar de nomes da cultura brasileira. Sobre João Cabral de Melo Neto, “endureceu o verso, asperizou a fonoaudiologia da língua”. Caraca.

Callado lembra de seu retorno ao país depois de longo anos no exterior. “Vontade de conhecer o Brasil, do resultado de acesso de amor ao Brasil saiu Quarup, romance publicado em 1967. Espero um dia ler.


A conversa rende, entre imagens de arquivo, e o encontro propriamente dito, a sensação é a de estar do lado. Só absorvendo, ou corroborando conhecimentos. De repente, para você não é novidade, conhece bem a obra deles. Para mim, serviu bastante.


Há uma certa, digamos, benevolência com Getúlio Vargas, nenhuma com a Ditadura, e rasgados elogios a Vinicius de Moraes – não só do Tom. Candido Portinari também é louvado, entre outros.


Eita, tá grande já. Se quiser, pode parar por aqui. Vai aí um vídeo, acho que tá na íntegra. Se pesquisar, deve achar mais opções. Também no Vimeo




Por aqui, sigamos com mais pinceladas que podem ser aplicadas perfeitamente ao tempo presente.


“Todo homem no futuro vai ser um viajor também. No privilégio de viver, você tem que incluir isso: trabalhar é a condição. Mas, usufruir do fruto do seu trabalho é uma obrigação social. A sociedade que nega isso a seus filhos é porque é uma sociedade imperfeita”


“No Xingu, conheci esses extraordinários brasileiros que estavam cuidando de um Brasil indígena que está desaparecendo aos nossos olhos em benefício de ninguém. Eles desaparecem, nós não vimos nenhum resultado disso. São grandes companhias que estão por assim dizer, ‘civilizando’ o interior do Brasil, diria acabando com o interior do Brasil. Não são fazendolas de brasileiros e lavradores. Estes estão vindo para as cidades morrer em Carandiru, nos morros do Rio. Mas, a ideia do Villas Boas era fundar o Brasil que também tivesse essa parte importante, essa parte indígena”, de Antonio Callado.


Talvez o passo em falso foi o assunto Mulheres. Muito, muito pouco. Não sei se por opção de edição. Aliás, verdade, quase nada alusivo ou lembrança a, por, e delas. Que pena.

Curiosidade também seria saber o que os quatro intelectuais diriam ou como se posicionariam em 2023. Trinta anos é coisa.

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Como se fora fim do encontro, a conversa descamba em frases desconcatenadas sobre culinária de insetos, futuro do Brasil, fim da utopias, e por aí vai.

“O homem, a qualquer momento da sua história é capaz de reverter os piores padrões de barbárie”.

3 Antônios e 1 Jobim encerra com eles aparentemente meio “borrachos”, cantando.

Mensagem de otimismo, talvez.


È isso, fica a dica. E a certeza de que a população brasileira tem muito a se orgulhar. E, refletir. Numa boa, de preferência.



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